sábado, 30 de setembro de 2017















Por ocasião da posse de Walter Pinheiro Noronha na Academia Itabaianense de Letras,
fui solicitada por ele a colocar letra em uma das músicas de autoria do seu patrono, Boanerges de Almeida Pinheiro, que também é nosso avô.

Honrada pela atribuição a mim conferida pelo primo, busquei as partituras no acervo da Sociedade Filarmônica Nossa Senhora da Conceição, da qual meu avô fez parte, para escolher a que mais se adequaria  a uma possível inspiração.

Para mim foi uma sensação de orgulho, ao mesmo tempo a consciência de que seria uma grande responsabilidade travar uma parceria com um músico sem ter a possibilidade de saber sua opinião a esse respeito. Confesso que não foi uma tarefa simples. No entanto foi singular em minha vida. Durante três dias não sosseguei até terminar de letrar a "Valsa - Eurides da Silva", escolhida pelo critério da sensibilidade e empatia com a história da referida música, que foi uma composição feita pelo meu avô em homenagem ao nascimento de uma filha do Maestro Antônio Silva, de quem era muito amigo.

Ao som da Filarmônica Nossa Senhora da Conceição, o então estudante de Canto Lírico pela UFBA, Jackson Trindade, encantou a todos os presentes, emprestando sua voz e sua Arte para render homenagem ao Patrono do acadêmico da noite, em um ambiente permeado de familiares dos dois.

No recinto da Câmara de Vereadores de Itabaiana, entre aplausos e lágrimas, vivi um dos mais lindos momentos, o qual poderia classificar como uma ponte entre o passado e o presente da família do homenageado e de fortalecimento dos laços entre os seus descendentes que ali se encontravam.





Eis então, como ficou a letra:

     Valsa - ‘Eurides da Silva’
 (in: Vida-Lida. Tereza Cristina Pinheiro Souza)

Colori de amor...
... De amor e honradez...
Eis a tela que fiz junto a vocês!
Sempre acreditei que a vida é assim:
Uma doce canção
E que não tem fim.

Valsa que compus,
Gravando em meu coração
Desejos de viver
Com marcas de justiça e fé.
Caminhando, ao som,
Sem deixar de ouvir...
É, a vida, o maior concerto!
Mistérios hão de existir...

Os porquês da vida
Não impedem ninguém de viver feliz...
Basta construir com amor e fé
E a certeza de que
Somos criaturas
Que nasceram para, juntas, viver a Paz!
Basta fazer o bem.
O bem... E nada mais!





quinta-feira, 28 de setembro de 2017








      Lembranças de vovô Boanerges

(in: Vida-Lida) Tereza Cristina

Ainda guardo sua imagem
Em minha memória afetiva
Que meus olhos de criança
Tiveram a alegria de fotografar.

Já era então um corpo frágil
Que uma velha bengala lhe servia.

O cenário aconchegante
De sua casa tão simples
Composto por poucos móveis
Tinha uma mesa redonda,
Uma cadeira de balanço,
Uma mesinha com um rádio
Na ampla sala de jantar.

Por uma janela aberta
Dessa sala de jantar,
De sua cadeira de balanço
Via um horizonte bonito!

Eram flores de zabumba
Brancas, viçosas plantinhas
Enfeitavam seu quintal
E acalmavam seus pulmões.

No alpendre tinha sombra,
Comum purrão grande de barro
Reservatório para uma bica
Que trazia água da chuva
Que escorria pelo telhado
Que decantada e dormida,
Na caneca ele bebia.


Nunca me esqueci
Das tardes naquela rede
Embalada pelas cantigas
De ninar da minha vó.

Ele, no balanço da cadeira,
Gostava de me olhar
E viajava pelas letras
De um livro tão grosso
Que me fazia pensar...

E tudo o que se ouvia
Era um silêncio no ar!
Nem lembro se ele dormia.

Uma voz então surgia:
“Ceça, ô Ceça!”
Não, não era a do meu avô.
Era a do seu papagaio,
Seu louro de estimação.

Era tão bom estar lá!

Minha lembrança auditiva
Como um arranjo musical
Conjuga canções de Luiz,
Cordas do relógio de parede
O som que saia do rádio
Com sua voz, que não esqueço!

Aquele homem franzino,
De olhos quase azuis
Cuidava da barba e cabelo
Era um velhinho cativante!

Costumava ir com ele
Até a barbearia.

Na sala bem na frente
Da casa de Seu Rola,
(um barbeiro bem velhinho)
Era muito divertido.

Conversa fluía a três...

Minhas perguntas constantes
Faziam os dois sorrirem
E por vezes, eu sem respostas ficava.
Não que fossem difíceis.
É que meu avô,
Sentado naquela cadeira,
Fazendo barba e cabelo
Nem podia responder.

Depois, expressando afeto,
Ele então perguntava:
“Me diga aí, quem souber,
Quem é meu cravo branco?”
E minha vó Ceça respondia:
“Sou eu”
Mas eu, competindo seu amor,
Sempre, sempre, rebatia,
“Não! Sou eu, sou eu, vovô!”

Parte deste homem
Com carinho eu guardei...
Cá dentro do meu coração.

A outra parte me veio
Regada de lágrimas
Pelas histórias que ouvi
Contadas por minha mãe,
A caçula de seus catorze filhos.

Falava de seu caráter,
Da sensibilidade artística,
Da rebeldia contra injustiça,
Da convicção religiosa,
Da afeição com os seus,
Da compaixão pelos pobres,
Da opinião formada da vida,
Do perfil de desapego...

Desprovido de riquezas
Seu legado me orgulha:
A fortaleza de alma
A simplicidade de Ser
Deixados como herança
Em sua obra e em sua vida!