Cá
com os meus botões
Tereza Cristina
Acordei
hoje precisando pensar por mim. Aproveitei ser um dia de domingo. O domingo é
sempre calmo para quem fica em casa enquanto o sol de verão lá fora brilha e
aquece fortemente como convidando as pessoas para um banho de mar ou de piscina.
Desliguei
o celular, Fiquei comigo. E toda tarefa que realizei foi de maneira silenciosa.
Parecia até aquele dia lá na minha infância, na preparação da minha primeira
Comunhão, quando na véspera, após a primeira confissão, onde participei de um retiro
promovido pelo Educandário Dom Bosco e organizado por Irmã Auxiliadora Graça
Leite. Agora, com uma diferença daquela ocasião que fui forçada a não
conversar. Estava com oito anos de
idade. Vale lembrar que a idade mínima para esse Sacramento é sete anos, por se
entender que é ‘a idade da consciência’. Há uma explicação melhor de Jean
Piaget no seu estudo sobre o desenvolvimento humano.
Comecei
o meu silencioso dia me reportando ao retiro para a minha primeira Comunhão. Olha
que estava com todas as crianças que do mesmo modo se preparavam para o rito de
iniciação da Eucaristia, um ritual religioso do catolicismo que nos apresenta
ao Corpo de Deus. Lembro bem das recomendações que minha mãe me fez para que
não falasse com ninguém, ninguém mesmo. Insistia dizendo que eu iria ter muita
vontade de conversar, mas essa era a forma de eu me preparar espiritualmente
para receber a Eucaristia, onde Jesus está Vivo. Era muito confuso entender
todas as explicações. Mas na minha época de criança, os questionamentos ainda
que não tivéssemos em retiro espiritual, eram sufocados pelos adultos. Agora,
depois de um caminho sobre a Pedagogia, imagino que essa era a metodologia mais
confortável para os que não tinham respostas e nem se colocavam como aprendizes
perante as perguntas de uma criança curiosa. Ter curiosidade era sinônimo de
rebeldia. Não se estimulava o diálogo. Eu era muito curiosa. E cá com os meus
botões, para não receber repreensão, continuava sempre com uma conversa
silenciosa. Era a forma de não me expor e no exercício da minha imaginação, ia
respondendo as minhas próprias perguntas, criando outras bem mais difíceis e
concluindo por exaustão até que voltava a um movimento de alguma brincadeira
qualquer. As minhas bonecas eram as minhas melhores possibilidades para produzir
meus textos. Para isso, colocava nome em cada uma delas como se quisesse personificá-las.
Entre todas, Marli Sobreviveu. E os meus textos, que apesar de não serem
verbalizados, não sumiram no tempo; ficaram no meu inconsciente e nas minhas
lembranças pueris. Servem-me até hoje de base para entender quanto o silêncio é
fundamental em nossa vida.
De tudo que posso recordar, o melhor foi compreender
que as minhas perguntas que ficaram sem respostas não foram inúteis. Aprendi
que nem sempre há uma resposta para todas elas. Mas, que nem por isso elas
devam desaparecer. Delas aproveitei para exercitar meu crescimento. Não me
refiro ao crescimento físico. Mas aquele crescimento que num ritual semelhante
ao de um retiro, se faz silencioso dentro de mim.
E,
ao contrário do outro crescimento, essa ebulição dos meus pensares continua até
hoje em processo. Cresço a cada vez que me pego com perguntas, feitas por mim
mesma, e que não obtenho respostas de fora. Então, agora por vontade livre e iniciativa
pessoal me recolho ao silêncio, sem que para isso tenha uma recomendação nesse
sentido, nem precise dialogar com bonecas.
Ao
longo de minha vida, experenciei momentos assim que me trouxeram e trazem lições
necessárias à harmonia interior. É um jeito de meditar. Nele, descobri que nem
sempre existem respostas prontas para nossas perguntas. Mas, nem por isso
devemos viver sem provocações. Que quando somos instigados a desejarmos
entender alguns mistérios deveremos aquietar a mente, apaziguar o coração,
respirar fundo e silenciar. Descobri que às vezes precisamos nos fazer ilha. Que
alguns dias, carecemos de um isolamento saudável que não ultrapasse a fronteira
do riso, da esperança e da alegria para quando do nosso reencontro com o outro.