A
fala é líquida
Tereza Cristina
Algumas delas
Há tempo que não se usa.
De tão guardadas
Elas murcharam
E se desmancharam.
Algumas são guardadas
Para noites de gala.
Outras vão à praia,
Brincam na areia,
E dizem muito
Sem se quer dizer!
Divagação
Tereza Cristina
Tenho
saudades de minha infância! Das brincadeiras com amiguinhos e dos brinquedos
inventados. Da inocência que nos favorecia o lazer num simples estar juntos na
calçada ou nos quintais, durante a nossa meninice.
Lembro-me
do meu olhar que às vezes pausava em algum momento em uma ou em outra situação.
Tinha mania de ficar quieta no meio da brincadeira. Era uma pausa para sentir
de perto, bem de pertinho de mim, a alegria
daquela atividade prazerosa. Por vezes eu divagava em plena brincadeira. Saia
dali com mais imaginação e voltava para vê se poderia enfeitar o instante de
contentamento. Era que eu tinha mania de associar as brincadeiras às estórias
de trancoso que ouvia. E eram lindas! Cheias de sonhos e vida real! Queria toda
a minha fantasia na brincadeira. Parecia até que já sabia de metáfora.
Misturava risos com serenidade. Volta e meia era repreendida por algum dos
amiguinhos que me chamava atenção. Então voltava a saltitar junto ao meu mundo
pueril com a leveza de quem não sabia nada da maldade.
O
tempo que ocupava com as peripécias da ludicidade era tão formidável que
passava muito depressa e eu não percebia
a necessidade de encerrar. Sempre era um
chamado de minha mãe que me fazia interromper o divertimento.
Com
o passar das estações fui notando a mudança natural. Outros momentos surgiram
com outras motivações. Mas, em todos eles mantive o interesse pela busca da
alegria, da afeição e do trato amigável para com o outro.
Então,
a vida me chama a ser séria e eu insisto em sorrir. Por causa dessa
irreverência tenho que pagar um preço.
Descubro que vale a pena. E vou colando nos meus dias aqui e ali algumas
figurinhas que me fizeram feliz como querendo conservar o mesmo sentimento.
Sempre que dá revejo os sonhos. Alguns ainda cheios de vontade. E assim viajo com meus botões para um lugar de
Alice. Confesso que é uma maravilha! Ao contrário do Coelho, sei muito
claramente onde quero chegar. Aprendi ao longo desses fevereiros vividos como
colorir a vida para que não desbote a sua vibração. Fui construindo um modo de
pensar. Ultrapassei os próprios sonhos
quando olhei ao meu redor. Quando percebi que a miséria humana vai além do
estômago. Quando me solidarizei com a lágrima de alguém. Quando me alegrei com
o brincar do desconhecido. Quando vi nesse desconhecido alguém parecido comigo.
Um
dia descobri que já tinha me tornado outra pessoa. Já não era tão primeira
pessoa porque a terceira me encantara. E sentir orgulho por esta nova visão de
mundo que tinha adquirido. Sou agradecida àquela menina sapeca que ficou em
mim. Sou agradecida aos que me ajudaram a guardá-la bem dentro do meu coração.
Mas,
essa menina também chora quando olha ao seu redor e não mais encontra os mesmos
pares. Há um vazio de brincadeiras...
Esse
devaneio que me fez sentir saudades da meninice é o mesmo que descobriu a
distância que essa visão de mundo patrocinou daqueles companheirinhos de
infância...
Fico
pensando na visão de mundo que amigos de
infância e parentes próximos construíram ao longo das suas histórias de vida. Que
aconteceu pelo meio do caminho? Qual a distância maior existente entre mim e
eles: a do pensamento ou a do sentimento? Um hiato surge logo agora que há uma
história tão linda de todos nós onde o tempo nos favoreceu contar e ouvir!